O futuro é padastro


O mais assustador em “The assessment” (2024) é perceber que mesmo as situações mais absurdas estão muito próximas da realidade. No filme de Fleur Fortuné, que se passa num futuro indeterminado, num mundo devastado pelas mudanças climáticas, uns poucos privilegiados, foram escolhidos para viver em segurança. Essa reagalia, porém, custa um preço: cidadãos são obrigados a se submeter a regras rígidas. Mia (Elizabeth Olsen, em papel ousado, mas que guarda semelhanças com a Feiticerira Escarlate do Universo Marvel) e Aaryan (Himesh Patel) querem ter um filho. Como o crescimento populacional é controlado com mão de ferro, eles devem se sujeitar a um teste bastante desagradável. É aí que entra Virginia (Alicia Vikander), assessora do governo que irá decidir se eles estão preparados ou não para a tarefa.

Fazer o papel de criança birrenta faz para ver como o casal vai lidar com o incômodo parte da avaliação de Virginia. O que parece um disparate pra quem assiste ao filme, mas que vai revelar uma pesada crítica social no fim. Mia Aaayran forma um casal interracial, negros e mulheres exercem papéis de destaque nessa sociedade futurista; logo, algumas injustiças parecem ter sido corrigidas. O epílogo trata de desfazer essa impressão: a sustentar esse Vórtex (assim como em “Zardoz”, de John Boorman, os privilegiados também têm seu tempo de vida artificialmente alongado) estão o esmagamento do indivíduo por forças que não pode se bater – o Estado capitalista – e relações de trabalho absolutamente desumanas. O desfecho sombrio, como não poderia deixar de ser, só aponta duas opções: a desistência ou o paliativo – caminho escolhido por Aaryan, demarcando a diferença entre pais e mães.

Curiosamente, esse elegio à maternidade foi escrito por dois homens, Dave Thomas e John Donnelly, e uma mulher, Nell Garfath-Cox.


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