Tempo não é sempre dinheiro


“LOLA”, é um pequeno prodígio que remete a outro filme igualmente prodigioso, “The artifice girl”, do qual já falei aqui, também feito sob o impacto da epidemia de Covid: ambos trabalham temas relevantes e já bastante abordados da ficção científica, com orçamentos bastante limitados, com grande inventividade. Se o último aproveita o debate sobre inteligência artificial para tratar da exploração sexual de crianças, este usa da viagem no tempo para falar, entre outras coisas, da impossibilidade do diálogo com fascistas.

O diretor Andrew Legge conta sua história – e de Angeli Macfarlane – à moda “Bruxa de Blair”; se por um lado o dispositivo dá ao filme carga de veracidade, por outro exige uma dose extra de suspensão de crença com suas câmeras (no caso, velhas 16 mm) onipresentes até quando não deveriam. Segundo se conta, as filmadoras foram operadas pelas próprias atrizes, Emma Appleton (Thomasina “Thom” Hanbury) e Stefanie Martini (Martha “Mars” Hanbury). Elas interpretam irmãs órfãs de guerra que vivem sozinhas numa propriedade isolada; a primeira, uma gênia, inventa uma engenhoca que capta transmissões de rádio e TV do futuro, que batiza de LOLA, em homenagem à mãe – mas eu desconfio que o nome vem da música homônima dos Kinks, já que “You really got me” embala uma das melhores sequências do filme.

Livres de amarras socias, as Hanbury são apenas meninas que querem se divertir, à frente de sua época. Inicialmente, usam a invenção como uma espécie de emissora do porvir, se encantam com David Bowie – o uso de “Space oddity” deve ter consumido boa parte do orçamento – e Bob Dylan, e outros acepipes do século XX, até que resolvem colaborar com o esforço de guerra. O problema é que são bem-sucedidas demais. O grande trunfo de “LOLA” é justamente o seu fescor contagiante, sua atmosfera de descobertas da juventude. Outro filme recente que lida com paradoxos temporais, “Sound of thunder” (2005), naufraga fragorosamente justamente por não conseguir driblar o dinheiro curto. Entusiasmo às vezes compensa a falta de grana.


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